terça-feira, 21 de novembro de 2017

FICHAMENTO: A ESTÉTICA DA DIFERENÇA E O ENSINO DAS LITERATURAS DE LÍNGUA INGLESA

Autores: Carolina, Cláudia, Denis, Fernanda e Glayds.

[Os conceitos de estética e diferença aparecem como opostos entre si. A estética está intimamente ligada com os valores ocidentais e tem uma perspectiva verdadeira e genuína, e internaliza a repressão, a colonização e a subjugação das massas em favor do bem-comum desinteressado. Tal visão pode ser considerada um equívoco, já que a estética também pode ser considerada o produto de uma relação sensorial individual com o mundo que nos rodeia.]

Segundo Festino (p.314):

O que deve ser levado em conta é que se a experiência sensorial é comum a todo ser humano, ela sempre será mediada pelo contexto cultural a que o indivíduo pertence; ou seja, é uma prática comunitária que depende do que é entendido como estético dentro da comunidade à qual o indivíduo pertence.

[No momento em que a estética começa a ser entendida como uma prática comunitária e diretamente relacionada com a cultura, onde propõem metáforas literárias que se desenvolvem de maneira diferenciada a uma obra de arte, percebemos que as culturas têm também diferentes teorias estéticas. Com isso, dá-se a origem da estética da diferença, onde torna-se visível o aspecto estético e social da literatura.

Já o termo diferença pode ser entendido como um jogo permanente entre forças que geram diferentes identidades culturais. Com isso, é chegado a um sem fim de continuidades.]
Para Festino (p.315): “Seria essa relação entre os diferentes discursos de um cânone literário: uma acomodação da tradição com a chegada de novas narrativas.
[Assim, como definição de estética da diferença, temos o amor do Outro por meio da apreciação de formas diferentes. O Outro não pode ser considerado um inimigo e sim algo parecido com uma ajuda para refletir sobre a nossa cultura e os tabus presentes em nossa sociedade.]
O LITERÁRIO: UM CONCEITO PLURAL
Entendemos o literário não como uma categoria universal, mas como uma das formas estéticas que em conjunto com a imaginação, articula o que um povo aprende da sua experiência. A Literatura tem significado diferente para cada cultura e cada cultura não só tem seu próprio estilo como também uma maneira diferenciada de entender diversos outros conceitos, consecutivamente entendem a literatura e seu papel na sociedade de maneiras diferenciadas.
Damrosch (2009, p. 13-14) aponta que, na tradição ocidental, literatura foi utilizado para se referir às narrativas “escritas com belas palavras” e sugere que essa beleza da linguagem é mais relevante do que qualquer uso ou afirmação do texto.
[No século dezenove, foi restringido pelo Ocidente o conceito de literatura às narrativas e produto da imaginação. Espera-se que as ideias articuladas por meio da literatura relacionem-se com o que a cultura entende como realidade. Eram em textos como Ramayana, o Mahabharata e o Bhagavad Gita (FESTINO, 2007), grandes épicos da cultura indiana, que podia-se ter acesso à história da cultura indiana pois tais textos articulavam os valores da comunidade enquanto que para um leitor ocidental estas mesmas histórias serão sempre narrativas épicas, produtos da imaginação.]
Os leitores esperam que todos os eventos de uma narrativa estejam claramente relacionados a documentos que o autor tenha lido, mas não tenha inventado. De outro ângulo, os diferentes gêneros literários variam de uma cultura para outra, tanto na sua forma como na sua recorrência. Da mesma maneira, dentro de uma cultura, os diferentes gêneros literários são considerados de maneira diferente.
[Enquanto o gênero romance é um produto da cultura ocidental, no século dezenove há diferenças marcantes entre o romance inglês. Literatura seria o conjunto de todas narrativas literárias. O que quer dizer, que o conceito de literatura não é universal e que o literário não é uma essência e sim produto da interação que se estabelece entre leitor e texto.]
“O que muda o valor do objeto não é o contexto cultural que faz com que estes sejam impregnados de um valor social ou de um valor estético” (ICKSTADT, 2002, p. 268).

“Quando alguém, por um julgamento estético, declara como bela a produção cultural ou artística de outra pessoa ou cultura, a estética funciona como uma ponte que vai além da diferença. Já quando a estética de outra pessoa ou cultura é considerada como inferior, a estética torna-se uma ferramenta de opressão” (ELLIOT, 2002, p. 3).

A estética não é inocente, mas ao declarar que uma obra artística é complexa ou banal, pertence a um artista maior ou menor, levanta questões ideológicas que perpassam o seu discurso. Quem faz esse tipo de asseveração considera a sua estética como universal, fora de qualquer questão de lugar e tempo e ignora diferenças culturais e históricas. Embora haja um cânone literário estabelecido, as narrativas que o conformam não são um conjunto homogêneo, porque as diferentes comunidades que formam a nação têm suas próprias narrativas diferentes entre si no estilo e no conteúdo.
[Todas as narrativas devem ser reconhecidas como literatura, no caso das línguas multiculturais, como a inglesa, muitas vezes acontece que epistemologias estéticas, são articuladas em uma língua comum, neste caso a inglesa, o que leva a agrupá-las dentro da mesma tradição e epistemologia estética. Todas essas epistemologias e culturas estão marcadas pela diferença e estão em contraponto umas com as outras. O fato de estarem articuladas na mesma língua reforça o estranhamento que se produz quando nos confrontamos com narrativas literárias provenientes de culturas que nem sempre associamos com essa língua e que se revelam totalmente diferentes do esperado.]
A estética sempre tem tido uma dimensão ética que tem servido a diferentes ideologias e interesses, de dominação ou de libertação. As narrativas literárias são uma das formas mais efetivas de persuasão cultural, como a sua contribuição para a formação de uma identidade nacional e seu uso como ferramenta de dominação colonial revelam.
[A autora explica que a estética entendida como uma visão universalizante pode se tornar uma prática de exclusão e dominação, entendendo assim que a estética influenciam diretamente na característica cultural, encontrando então características próprias.]
A modo de exemplo, a historiografia da disciplina “Literatura Inglesa” mostra que ela foi primeiramente aplicada na Índia como ferramenta de colonização, porque, por meio de suas narrativas, repassavam-se para os indianos, tidos como uma cultura primitiva, os valores da cultura inglesa (VISWANATHAN, 1989). Logo, foi o canal pelo qual se repassaram para os trabalhadores do norte da Inglaterra e para as mulheres os valores da classe social dominante inglesa.
Para Matthew Arnold (1869), as narrativas que compunham o cânone inglês tinham um status quase sagrado no sentido de que articulavam os valores mais sofisticados da cultura inglesa. Esse tipo de ideologia se manifesta no fato de prestigiar os valores de um panteão de escritores, homens, brancos e euro-americanos, nunca sujeito a mudanças, o qual revela  que, muitas vezes, o que se considera como universal é o cânone Ocidental.


Nas últimas décadas e, a partir de uma estética da diferença, que dá relevância ao aspecto social, a estética tem-se tornado uma prática de inclusão que considera o elemento de conflito na convivência entre grupos de interesses diferentes. Essa visão social da estética leva a uma leitura que considera a maneira como a metáfora literária articula as experiências do dia a dia dos leitores mediadas por questões de classe, raça, gênero, etnia, etc. Ao invés de tentar escapar dos conflitos sociais pela imposição de valores morais e éticos e a transcendência a algum plano superior, abstrato e universal, possibilitado pelo caráter sublime da metáfora literária.
Dewey explica que, para entender a arte na sua forma final, como é apresentada para o público, é preciso começar com as cenas e eventos que chamam a atenção do olhar e do ouvido do homem e que lhe causam prazer ao escutar ou enxergá-las: a visão de uma multidão, um homem suspenso no ar em um palanque, a graça do jogador de bola que cativa a audiência, uma dona de casa tomando conta de uma plantinha. É por isso que, na opinião do filósofo, a arte que tem mais vitalidade é a arte que se considera como popular: o cinema, os gibis, os gêneros policiais etc., enquanto a arte que é relegada ao museu perde a sua energia, tende a se tornar anêmica, e fica isolada e relegada a uns poucos.
[A imposição de narrativas sobre as deles era uma maneira de evitar o que se entendia como anarquia e barbárie e esse desejo de unificação fez com que a literatura se tornasse uma ferramenta de opressão social e cultural ao impor os valores das elites dominantes a colonizados, classe baixa e mulheres, sendo usada para reafirmar preconceitos nacionais, raciais, de gênero entre outros.]
Considerado dessa maneira, o conteúdo estético e afetivo das narrativas literárias torna-se um canal adequado para uma renovação da sociedade em geral e, no caso das literaturas estrangeiras, torna-se um discurso mediador das relações entre diferentes culturas.
A poeta norte-americana Adrienne Rich, cita: “[...] o estético não é uma visão privilegiada e isolada do sofrimento humano, mas uma notícia de conscientização, de resistência que os sistemas totalizantes querem subjugar: a arte alcança o que ainda é apaixonado, ainda não é reprimido, ainda não é subjugado”.
 Dessa maneira, pela leitura de textos literários, entendidos como construções históricas e sociais que, por sua vez, não só afirmam, mas também interrogam a história das diferentes culturas, passa-se a perceber o modo em que a própria cultura se relaciona com outros locais e, por meio desse posicionamento crítico, torna-se parte de um processo de mudança.
Falando da educação em sentido lato, a aula de literatura em geral e a estrangeira em particular tornam-se um terreno em que o aprendizado está intimamente ligado a conceitos de lugar, identidade, história e poder, uma vez que permitem uma reconsideração não só da leitura de textos produzidos em culturas tidas como hegemônicas ou periféricas, mas também dos círculos de poder (acadêmicos, políticos, editoriais etc.) que legitimam a leitura de determinados textos em detrimento de outros.
[Em outro nível, essa leitura social da arte contribui para uma sensibilização com a cultura do outro, tanto dentro como fora das fronteiras nacionais, pela desconstrução de estereótipos culturais. Essa função da estética tem a ver com seu aspecto ético. E para encerra, uma citação de Derrida (1992, p. 58), que nos faz entender e refletir um pouco mais sobre a literatura: “A Literatura em geral é um lugar institucional e selvagem; um lugar institucional no que é permissível questionar, ou ainda colocar em suspenso, a instituição toda”.]
O TROPO DA DIFERENÇA
[Na aula de literatura inglesa, o tropo da diferença deveria ser o principal, pois vincula-se no encontro entre texto, autor e leitor. As narrativas pertencem a uma rede de significações complexa, que se transformam constantemente, seja dentro ou fora da comunidade em que foi escrita, mostrando a penetração recíproca entre comunidades discursivas diferentes.]
Segundo Fish (1982):
Esse processo implica uma familiarização com metáforas e práticas literárias que não necessariamente vão coincidir com aquelas da nossa cultura, porque respondem a uma concepção de literatura que tem a ver comoutras comunidades interpretativas
[As considerações de Fish mostram que o valor ou a distinção entre o literário e não literário é mutável, nunca está explicito no texto, pois é cultural e está vinculada a relação obtida entre leitor e texto. Já quando se trata de características formais do texto, pode-se dizer que são associadas a diferenças culturais.]
Por exemplo, Hughes & Trautman (1995, p. 172) apontam que nas comunidades judeu-cristãs o conceito de tempo é linear e implica nascimento, vida e morte. Na comunidade hindu, a reencarnação apresenta o conceito de tempo de maneira circular, uma passagem contínua entre uma vida e outra, o que vai implicar uma forma diferente de enredo que, mais do que se organizar em princípio, meio e fim, implica um constante recomeçar. Ao mesmo tempo, a estrutura episódica das narrativas indianas faz com que a estória seja narrada por meio de uma série de enredos e subenredos que se complementam uns com outros, revelando a pluralidade e polifonia da comunidade indiana. Colocar o foco em um ou outro episódio faz com que a narrativa adquira uma significação diferente (PANIKER, 2003).
 [Nota-se então, que os aspectos sociais são complementares aos estéticos, neste tipo de leitura o contexto cultural é que define a estética, e a estética tem papel de ajudar a formatar melhor os temas culturais, sendo ambas intrínsecas. É necessário que o professor, que ao trabalhar uma literatura multicultural em língua inglesa e se deparar com diversas traduções literais, se familiarize com teorias de conhecimento estéticas e sistemas culturais diferentes, afim de não limitar os textos literários a meras narrativas sociais, ou até mesmo depreciar, desqualificar sistemas artísticos por não coincidirem com os de nossa cultura].

REFLEXÕES FINAIS
[Entendemos que a estética da diferença é central em um mundo dividido pelos conflitos entre as diferentes comunidades da sociedade globalizada. Ensinar a diferença implica ensinar as condições não só literárias, mas culturais, sociais e políticas que informam a comunidade onde a narrativa foi escrita. Nesse sentido, o texto literário não é um fim em si mesmo, mas uma zona de contato que ajuda a desconstruir as visões, muitas vezes negativas, de outras comunidades que os alunos trazem para a sala de aula]



[Segundo Helen Hoy (2001, p.11) o conceito de diferença é assimétrico e implica a pergunta “Diferença, mas do ponto de vista de quem?” A escritora discute o caso de escritores canadenses que são questionados sobre o que significa ser um escritor nativo, sobre seus costumes, mas nunca sobre o processo de escrita, sua diferença é restrita a questão de raça. Se por um lado, ignorar a diferença tem um efeito negativo, por outro, fixar-se nela tornando-a o único tropo, no caso de comunidades consideradas como minorias, tem um caráter redutivo e restritivo. Muitas vezes há um desejo de enfatizar sua diferença, essa atitude reflete na sua resistência a que outras pessoas, fora da comunidade se apropriem de suas narrativas, porque só eles podem narrar e entender, não admitem posicionamentos e interpretações diferentes.]

[O título do livro de Hoy, Como deveria ler essas [estórias]? Aponta para esses conflitos: a diferença entendida como irredutível que coloca uns em nível de superioridade comparados com o Outro. Uma maneira de negociar as diferenças seria, não comente por via do cânone, mas pela reformulação do conceito de narrativa e da leitura do s textos literários não como narrativas universais, mas como processos de significação que vão variar o contexto cultural e as relações entre as pessoas envolvidas.]

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