sexta-feira, 29 de maio de 2015

A Retratação da Mulher no Romantismo e Realismo

Romantismo

Anjo és

Anjo és tu, que esse poder
Jamais o teve mulher,
Jamais o há-de ter em mim.
Anjo és, que me domina
Teu ser o meu ser sem fim;
Minha razão insolente
Ao teu capricho se inclina,
E minha alma forte, ardente,
Que nenhum jugo respeita,
Covardemente sujeita
Anda humilde a teu poder.
Anjo és tu, não és mulher.

Anjo és. Mas que anjo és tu?
Em tua frente anuviada
Não vejo a c'roa nevada
Das alvas rosas do céu.
Em teu seio ardente e nu
Não vejo ondear o véu
Com que o sôfrego pudor
Vela os mistérios d'amor.
Teus olhos têm negra a cor,
Cor de noite sem estrela;
A chama é vivaz e é bela,
Mas luz não tem. - Que anjo és tu?
Em nome de quem vieste?
Paz ou guerra me trouxeste
De Jeová ou Belzebu?

Não respondes - e em teus braços
Com frenéticos abraços
Me tens apertado, estreito!...
Isto que me cai no peito
Que foi?... Lágrima? - Escaldou-me
Queima, abrasa, ulcera... Dou-me,
Dou-me a ti, anjo maldito,
Que este ardor que me devora
É já fogo de precito,
Fogo eterno, que em má hora
Trouxeste de lá... De donde?
Em que mistérios se esconde
Teu fatal, estranho ser!
Anjo és tu ou és mulher?

O poema "Anjo és", de Almeida Garrett, demonstra claramente a representação da mulher no Romantismo. Nele, pode-se perceber toda a idealização da mulher: ela é capaz de dominar o homem, o que se observa em "que me domina teu ser o meu ser sem fim" e "minha alma forte anda humilde a teu poder".

Em alguns trechos, Garrett se mostra perturbado com a figura feminina por não saber se é um anjo ou uma mulher. Por um lado, “frenéticos abraços”, “este ardor que me devora” e “fogo eterno” remetem a uma certa sensualidade, e isso o faz acreditar que ela é uma mulher. Porém, ele também acredita que ela é um anjo, tamanho o poder que ela tem sobre ele, o que fica claro no seguinte verso: "E minha alma forte anda humilde a teu poder”.

Realismo

Já no realismo, as mulheres são bem menos idealizadas e mais condizentes com a realidade, tendo uma personalidade concreta e não meramente uma figura cercada de mistério e exagero. Como, por exemplo, Capitu do romance de Machado de Assis, Dom Casmurro.

Capitu é caracterizada como mulher de vontade firme, determinada e sensual. Ela faz uso de artimanhas com o propósito de desafiar as condições impostas às mulheres da época. “Capitu era Capitu, isto é, uma criatura mui particular, mais mulher do que eu era homem. Se ainda o não disse, aí fica”. Esse trecho da obra exemplifica claramente como as mulheres no realismo não eram frágeis figuras etéreas no imaginário do escritor, mas uma presença forte com características próprias e nada idealizadas.

Sofia também é outra personagem feminina nem um pouco idealizada. Belíssima, charmosa, narcisista, exibida publicamente pelo marido que se compraz em vê-la encantar os homens, ela usa todas as técnicas possíveis de sedução, para tirar proveito de Rubião, sem jamais chegar ao adultério.
                                                                                                        
Há também o exemplo do livro “O Cortiço”, onde existem varias personagens femininas totalmente não idealizadas, como, por exemplo, Bertoleza, que é uma escrava que pensa ter comprado sua liberdade, representando assim o trabalhador escravo. Na obra ela geralmente aparece fazendo trabalhos domésticos, uma coisa impensável no período romântico.

Há também no mesmo livro a Rita Baiana, a mulata sensual do Cortiço, representando a mulher brasileira. Ela se aproveita da sua beleza para se casar com Jerônimo e melhorar de vida.

No Romantismo, as angelicais e idealizadas mulheres eram o estereótipo que a burguesia pretendia ser, mas nem sempre conseguia. No realismo os tempos eram outros: a sociedade burguesa estava estabelecida e os realistas a criticavam. Eles retratavam em suas personagens uma coletividade, e não características e situações individuais. 

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